Marcos Sacramento harmoniza em Amsterdã modernidade e tradição na música brasileira
Texto: Daniel Duclós
Fotos: Carla Duclós
No dia 18 de junho aconteceu o primeiro show de Marcos Sacramento em Amsterdã, parte da turnê européia de lançamento do álbum Na Cabeça (Biscoito Fino/2009). O CD foi gravado com Sacramento acompanhado por três violonistas, Luiz Flavio Alcofra (violão de 6 cordas), Rogério Caetano (violão de 7 cordas) e Zé Paulo Becker (violão de seis cordas), e faz parte de um ciclo acústico no trabalho do cantor. Para a turnê, além dos músicos que participaram da gravação, veio também o percussionista Netinho Albuquerque no pandeiro. Aqui em Amsterdã, a apresentação inaugurou as Brazilian Summer Sessions, organizadas pela fundação A Hora do Brasil pelo terceiro ano consecutivo na casa de show Bimhuis.
Luiz Flávio Alcofra, Rogério Caetano, Marcos Sacramento, Netinho Albuquerque e Zé Paulo Becker
Marcos Sacramento é apresentado como um dos melhores cantores de sua geração. Recusa rótulos, mas aceita o desafio de cantar músicas interpretadas e compostas por grandes gênios do samba e da MPB, estabelecendo uma linhagem para o seu trabalho contemporâneo. A Holanda viu nesta noite o melhor da música brasileira como algo vivo e vibrante sendo projetado para o futuro.
O show começou poucos minutos depois das 21h00 com a casa lotada por brasileiros e holandeses. Entraram no palco apenas os três violinistas, mas logo Sacramento se juntou à eles cantando a faixa título do CD. A banda continuou com minha Palhoça, Um Samba, Dia Santo Também e duas belas composições de Luiz Alcofra, Calúnia e Pavio, esta última uma parceira com Sérgio Natureza e uma homenagem ao Rio de Janeiro, cidade linda, abandonada e violenta, como lembra Sacramento.
Até este momento, todas as músicas faziam parte do trabalho novo, mas é hora de um reforço, Netinho Albuquerque, se juntar aos outros quatro e expandir o repertório. Triste Cuíca, de Noel Rosa é a primeira, seguida de Desconsideração, outra composição de Alcofra cantada por Marcos no CD Sacramentos. Nesse ponto a platéia está bem animada, e aplaude inclusive no meio de Cai Dentro, música de Baden Powell e Paulo Cesar Pinheiro que já foi cantada por Elis Regina. Sacramento então deixa o palco nas mãos do quarteto acústico, que toca Lembranças do Morro, do lendário violonista brasileiro Garoto. Parceiro constante de Carmen Miranda, não seria a última vez que a noite remeteria à cantora que promoveu o South American Way no exterior, tema bem apropriado para a noite.
O intervalo teve no bar da Bimhuis muita caipirinha sendo vendida tendo como pano de fundo um espetacular pôr-do-sol visível através das paredes de vidro da casa, o que ilustrava perfeitamente a cultura brasileira entrando na noite holandesa para alegria de todos. Na volta, recomeçam a apresentação dos trabalhos que completam o Na Cabeça e mais do melhor do samba. Prisioneiro do Mar vem só pra esquentar, acelerando rápido para uma versão empolgante de Bambo do Bambu de Carmen Miranda. Durante todo o show Sacramento interpreta não só com a sua voz, mas de corpo todo as músicas, levando uma platéia que pode até ser um pouco dura no samba, mas é generosa nos aplausos merecidos. A simpatia e bom humor do cantor fizeram ele se sair muito bem do único incidente da noite. No meio da apresentação de A Rosa de Chico Buarque, pifou o fio de um microfone. Sacramento até continuou somente na garganta, para delírio da platéia, mas quando o segundo microfone não resolveu o problema, ele foi obrigado a parar. A situação foi salva por Netinho Albuquerque, que ofereceu o microfone sem fio que estava usando para backing vocal, e a banda recomeçou com a promessa de Sacramento de que a segunda vez seria muito melhor. E foi.
Depois de cantar South American Way, já no final da apresentação, Sacramento abre as cortinas do fundo do palco deixando aparecer Amsterdã iluminada à noite para a última música, uma versão arrasadora de Baião da Penha, que levanta a platéia. Os músicos agradecem os aplausos de pé e cedem um bis misturando Bambo do Bambu e Cai Dentro, com Sacramento dando bronca no fio traidor enquanto canta. Ao final, um show excelente, onde harmonizaram-se clássicos do passado e novos trabalhos, mostrando que a boa música brasileira é linguagem universal e eterna.