Quem explica? Freud ou Sade?
Denise Parma
"Em
briga de marido e mulher não
se mete a colher". O
adágio popular alerta aos desavisados, àqueles
que,
com o intuito de ajudarem a resolver
os problemas
conjugais dos outros, acabam criando
problemas para si
mesmos. Viajando pela Baixada Maranhense,
deparei-me
com uma cena que só veio a reforçar
a sabedoria de tal
provérbio e colocar-me de sobreaviso
para situações
parecidas, no futuro.
Foi
de manhã bem cedo, à hora
do café,
que o casal da
casa ao lado começou a discutir.
O que, em princípio,
parecia uma simples discussão,
tão comum à maioria
dos
casais, foi ganhando proporções
cada vez maiores.
Entre palavrões, capazes de causar
arrepios no próprio
demo, a mulher lançava acusações
ao marido, alegando
não cumprir o mesmo com suas
responsabilidades de
chefe de família, e que, ao invés
de trabalhar,
passava o dia ocupado com seus
passarinhos. O homem,
por seu lado, alteradíssimo, replicava
aos berros, não
ficando atrás quanto ao
vocabulário
empregado.Tentei
tomar meu café ignorando aqueles
dois, mas não
consegui; abreviei então o café e
dirigi-me à sala,
torcendo que por lá o barulho
dos brigões não
me
chegasse tão audível aos
ouvidos. Estava, já,
a meio
caminho, quando ouvi um grito.
A ajudante da casa veio
quase correndo relatar a causa de
tal grito: "O homem
deu um tapa tão grande na
mulher que ela foi parar
lá
no meio do quintal!" contou-me com
uma cara onde medo
e preocupação misturavam-se,
formando uma máscara
lívida. Fiquei indignada ao ouvir
tal coisa, mas não
tive tempo de esboçar nenhuma
reação,
pois mais um
grito juntava-se ao primeiro,
sendo seguido por muitos
outros. Não aguentando mais
ouvir aquilo, decidi sair
de casa.
Confesso
que senti o sangue ferver ao passar
em
frente à casa daquele casal.
Tive vontande de entrar
lá, pegar o tal sujeito e
aplicar-lhe uma boa sova,
para fazê-lo sentir na própria
pele a dor que estava
causando; porém, não
sendo dotada dos meios
necessários para tal proeza, tamanho,
força
e
imprudência, prossegui meu
caminho, um tanto abalada
pelos acontecimentos.
Ouvir
uma mulher adulta chorando por estar
apanhando
do marido, é chocante. Quantas
cenas como esta
estariam acontecendo
em todo o Brasil naquele
momento?
Algumas centenas? Milhares talvez?
... E no Mundo?...
Centenas de milhares?...
Meditando
sobre o assunto, perguntava-me qual
a
decisão mais certa a tomar
num momento daquele.
Procurar não intrometer-me,
como os outros
vizinhos? Ligar para a
polícia? Ou deixar
que a envolvida
no caso o fizesse?
já que a senhora
em questão
era uma
mulher esclarecida,
que conhecia seus
direitos e,
portanto, consciente do que lhe competia
fazer diante
da situação.
Algumas
horas depois, ao voltar para casa,
encontrei
a tal vizinha a queixar-se para minha
mãe, que mais
indignada que eu, pedia-lhe que tomasse
alguma
providência, que não
se submetesse
a tamanha humilhação.
"Mas
eu não consigo largar esse
homem!" respondeu
em tom choroso. Pasmada, fiquei
a olhá-la, sem saber
direito o que pensar diante de
tal declaração. Só,
então, percebi o perigo a que
me teria exposto caso
tentasse ajudar tal "vítima"...
O caso ganhou nova dimensões aos meus olhos, e ainda estou na dúvida, se
esta senhora é mais um caso para os discípulos
de Freud, ou quem sabe... é admiradora de Sade.
E pensar que era o dia 8 de março, Dia Internacional
da Mulher.
O
problema da violência contra
a mulher é um problema
mundial, afetando todas as camadas
da sociedade. Como
combater tamanha praga? Onde está a
causa do problema? Muito já foi
discutido sobre este assunto ao longo
dos anos. Embora a mulher tenha conquistado
mais espaço
dentro da sociedade, ainda continua
sendo lesada,
física e emocionalmente.
© Denise Parma 2004
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