"Moeders Mooiste"
Denise Parma
"À medida que a menina foi crescendo e entrando em
idade de aprender, foi-lhe ela mesma ensinando a ler e
escrever." Bernardo Guimarães.
Maio, mês das Mães. Como forma de homenagear "de
Purmerenders moeders" a Biblioteca Central de
Purmerend organizou uma exposição intitulada "Moeders
Mooiste", com roupas infantis confeccionadas por mães
holandesas nos anos cinquenta e sessenta; além das
roupas, há também, fotos de crianças trajando peças
da época; retalhos, novelos de lã e alguns
instrumentos utilizados na confecção de roupas, como
agulhas de crochê, agulhas de tricô e máquinas de
costura.
Dentre as peças expostas a que mais me chamou a
atenção foi uma antiga máquina de costura movida a
manivela. O avistar de tal máquina avivou-me a
recordação da antiga máquina de costura de minha mãe, uma Singer, movida a pedal, herança de minha avó.
Filho de funcionário público não tem uma vida das mais
abastadas, porém, como a maioria das mães de classe
baixa, a minha tinha inúmeras quantidades de idéias
para driblar as necessidades, a fim de proporcionar um
certo conforto à prole. Quantas e quantas horas vi
minha mãe sentada atrás daquela máquina, mesmo depois
de ter passado horas trabalhando fora de casa, a fim
de incrementar nosso guarda-roupa... E, enquanto saiam
de suas mãos mais uma de suas criações, ela
cantarolava no ritmo da costura, e nossa casa
enchia-se de sons de máquina e de candura... Quantos
pensamentos misturaram-se a cada ponto? Quantas
preocupações foram suspiradas a cada pedalada? E
soluções... Quantas não lhe vieram à mente depois de
mais um arremate?
Mamãe não costura mais. "Não tenho mais paciência,
saúde e nem necessidade", diz. A Singer aposentou-se
com ela. Os filhos crescidos já dão conta das próprias
necessidades, inclusive das roupas. As filhas, se não
costuram não é por falta de talento (no caso de minha
irmã), nem de necessidade (no meu caso), faltou-lhes
paciência, sobrou-lhes a teimosia (e as consequências
dela) adolescentes de quererem trilhar sempre o caminho
contrário àquele oferecido... Minha irmã e eu jamais
conseguimos acompanhar, mais que uma semana, um dos
cursos de Corte e Costura, nos quais minha mãe teimava
em nos matricular. Não sei o que a levava a
insistir... Talvez quisesse transformar o uso da velha
Singer numa espécie de tradição familiar. Quem sabe
ela se orgulharia se pudesse ouvir uma de nós falando
com a filha: "Essa máquina era da bisavó de vocês, foi
nela que a avó de vocês aprendeu a costurar, assim
como a mãe e a tia de vocês... Daqui a pouco, vocês
também aprenderão a costurar nela..."
Por sorte minhas sobrinhas nasceram numa época
diferente da da escrava Isaura, não é necessário ser "prendada" para dar conta do recado, no mundo moderno.
No primeiro mundo, a mulherada menos abastada se vira
com a Zeeman, no terceiro, com os camelôs...
E, quanto a mim, se arrependimento matasse, morreria
cada vez que preciso pagar para que me encurtem as
calças nesta terra de gente caneluda. Mamãe bem que
tentou evitar isso...
© Denise Parma 2005
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