Meu príncipe, um peru assado, e muito, muito spray
Adriana van den Broek
Quando a gente está lá no Brasil, apaixonada por um estrangeiro,
passando por tudo aquilo que o Marlio tão bem descreveu em seu texto "A burocracia do amor", tudo o que a gente quer é ver logo o visto no
passaporte pra acabar de vez com o namoro à distância, acabar com as
despedidas chorosas nos aeroportos, não ter mais que ficar olhando
pela telinha da webcam para uma pessoa que parece estar tão perto mas
que está tão longe. Quando esse bendito visto chega, a mala é feita
num minuto, uma festinha de despedida, e quando você menos percebe,
está em solo holandês começando outras tantas batalhas.
Um dia, numa agência de viagens internacionais, a vendedora me
pergunta: que membro da sua família aqui na Holanda nós devemos
contactar em caso de acidente? E foi aí que a realidade me estapeou a
cara sem a menor piedade: meu marido não tem contato nenhum com a
família dele, e a minha está toda no Brasil. Meu Deus do céu, estamos
totalmente sós. Nesse momento veio a tona o remorso por ter me mudado
para a Holanda três meses após o divórcio da minha mãe, de ter deixado
meus sobrinhos no aeroporto sem entender muito bem o que estava
acontecendo, de não ter passado mais tempo com a minha melhor amiga,
de não ter passado mais tempo com as tias, primos, irmão, avós…
O relacionamento "além-mar" já começa carregado de sacrifícios. Há
quem ache ultra-romântico, aquela coisa de "o amor supera tudo", mas
na prática é difícil, muito difícil. Eu me lembro das minhas amigas
recém-casadas no Brasil, reclamando que o marido deixava roupa pra
todo lado, que detestavam ter que chegar em casa e fazer o jantar
todos os dias, que a faxineira deu o cano justo na semana da festinha
de aniversário dele, das briguinhas para decidir se passavam o Natal
com os pais de um ou com os pais de outro. Se adaptar à vida de casado
não é mesmo fácil.
Some a isso não saber ler um rótulo de produto ao fazer as compras de
supermercado ( eu comprei comida de gato achando que era atum ),
depender do seu marido para pegar qualquer documentozinho na
prefeitura, não ter faxineira ( ou pagar os olhos da cara para uma que
venha umas horinhas por semana ), não entender patavinas na TV,
jornais e revistas, e o que para mim é o pior: ver o Natal chegar e
saber que se não formos para o Brasil, seremos só nós dois, uma árvore
de Natal e um peru assado.
Aos poucos a gente vai se adaptando à vida de casado, tem sempre uns "pega-pra-capar" mas depois que eu descobri a maravilha dos
sprayzinhos e lencinhos umedecidos para limpeza, a coisa vai melhor.
Spray depois do banho nos azulejos do banheiro, vassoura com spray
acoplado para limpar o chão do banheiro sem ralo, lencinhos umedecidos
para limpar ao redor do vaso sanitário e pia, sprayzinho
desengordurante no fogão, vassoura com outro sprayzinho no piso
laminado da sala, sprayzinho limpa-sofá-de-couro, e pra terminar, a
vassourinha chuchadora de vaso sanitário, que para essa, eu ainda não
achei sprayzinho substituto. O amor movido a sprays.
Já o problema da falta de família, informo que a minha estará
aumentando em breve. Não, não estou grávida, sou a orgulhosa mamãe de
dois gatinhos ragdoll que ainda estão no gatil, mas em breve estarão
em casa. Quem quiser ver meus bebezinhos, de uma olhadinha no www.fotolog.net/fofocatz .
Mas a dica mais preciosa para quem quer se adaptar mais rápido e sem
sofrimento, é se cercar de amigos o mais rápido que puder. Não
precisam ser muitos, mas precisam ser bons. Minha vida melhorou
imensamente depois que encontrei com quem dividir notícias boas e
pedir ombro para chorar.
Meu marido, que foi a razão de toda essa mudança continua sendo o
príncipe encantado. Um príncipe encantado diferente do que eu conhecia
antes de casar, mas acho que isso acontece com todo mundo. Mas
definitivamente, ele não virou sapo. Ainda bem!
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