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Clarissa Mattos - Baiana de Salvador, administradora de empresas e pós-graduada em Marketing e E-Business, nos últimos anos tem atuado nas áreas de comunicação e marketing. Hoje mora em De Bilt e, além de música, cinema, literatura e fotografia, adora conhecer novas pessoas, lugares e culturas.
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Ponto de Integração
Clarissa Mattos
Ontem me perguntaram quais eram as minhas primeiras impressões da Holanda. Aliás, já me perguntaram muitas e muitas e vezes e nunca consigo dar uma resposta precisa. Cheguei há pouco mais de dois meses e ainda não tive tempo de organizar nem a casa, nem os sentimentos. Só sei que a primeira sensação que tive foi de frustração quando, ao chegar, percebi que toda a trabalheira com tanta burocracia resultou em um visto provisório que me dá o direito de estar, mas não de ser. Sim, ainda estou no aguardo do famoso verblijfsvergunning, o visto que dá direito a trabalhar, ter conta em banco, cartão de crédito e outras coisas comuns a qualquer cidadão. Enquanto esse bicho de nome esquisito não vem, tento entender um pouco mais esse minúsculo, mas intrigante país.
Aprender a entender como são as pessoas e como as coisas funcionam é uma luta diária, entremeada de muitos mal-entendidos. Não estou nem falando da língua. Falo na verdade das pequenas diferenças culturais. Essas que povoam as mínimas coisas do nosso dia-a-dia. É aquele terceiro beijo que você esquece e deixa a criatura com cabeça esticada no ar como uma tartaruga. Ou quando logo ao ser apresentado você cumprimenta com um beijo e o constrangimento pisca como um luminoso de neon na cara do apresentado. Ou, ainda falando do beijo, quando ao se despedir, a pessoa acena um doei, vai embora e você fica com a sensação de que tá faltando alguma coisa.
Quando estamos de férias em um outro país, a sensação de liberdade, de que ninguém nos conhece e de que podemos fazer o que quisermos faz parte da fantasia do turista e do prazer da viagem. Agora, ao mudar para um país estranho, a coisa é diferente. Queremos sair da exceção, não queremos errar socialmente nem agir de forma estranha ou parecer uma figura exótica em exibição. Ao mesmo tempo, não queremos (nem podemos) largar tudo o que aprendemos e carregamos durante toda a nossa vida. Eis o grande mistério da integração! Até onde consigo viver de maneira espontânea e natural num ambiente novo, mantendo os meus hábitos, gostos e cultura.
Sou baiana de Salvador, mas vivi os últimos doze anos no Rio. Acredito que essa experiência pode servir de laboratório - guardadas todas as devidas proporções - para a situação atual. É óbvio que ao morar em outra cidade por tantos anos adquiri novos costumes, palavras, um toque no sotaque e aprendi novos códigos sociais, mas isso não me transformou numa carioca postiça. Ao mesmo tempo, não sou a mesma pessoa que deixou Salvador, tampouco tenho a mesma relação com a cidade. Entretanto, em nenhum momento, Salvador deixou de ser a minha origem, minha cidade natal. Talvez a distância tenha até acentuado esse sentimento. E o Rio? O Rio foi adicionado na minha vida e hoje é um outro lugar muito especial para mim.
Agora a distância é maior, como também são as diferenças. Sei que tenho uma montanha russa de situações e emoções pela frente e muito o que aprender. Os primeiros passos, acredito eu, são: não resisitir, não excluir nada, não pré-julgar e observar. Mesmo parada no mesmo lugar, você está mudando todo dia. Cada pessoa ou lugar que passa pela sua vida, traz mudanças para você e em você. E a recíproca é verdadeira. Cabe a cada um encontrar o seu ponto de equilíbrio ou melhor, o seu ponto de integração. Você nunca vai deixar de ser quem você é e ainda pode deixar o seu toque, a sua contribuição no ambiente em que vive. Até porque a gente sabe que um pouco de sotaque brasileiro não vai fazer mal nenhum a esse país, não é mesmo? Que venha a Holanda!
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