Clarissa Mattos - Baiana de Salvador, administradora de empresas e pós-graduada em Marketing e E-Business, nos últimos anos tem atuado nas áreas de comunicação e marketing. Hoje mora em De Bilt e, além de música, cinema, literatura e fotografia, adora conhecer novas pessoas, lugares e culturas.
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Amizade: dois países, dois caminhos e um só destino.
Clarissa Mattos
O que mais impede de ter um bom amigo é o empenho em ter muitos. A amizade quer ser antiga.
(Plutarco)
Festas de fim de ano, dias frios, escuros e mais curtos. Essa combinação nada explosiva e sim depressiva alimenta antigas saudades e desperta novos incômodos. Acho que para quem está longe de casa, esse é um momento não de serenidade, mas de muita inquietação e autoquestionamento. Num desses momentos, perguntei a mim mesma o que mais me fazia falta aqui. O sentimento era generalizado: saudades de lugares, cidades, do clima e de pessoas. No final, cheguei à conclusão que sentia falta mesmo era da espontaneidade do povo e da facilidade de se fazer amigos. Sabe aquele papo que engata num encontro fortuito e no dia seguinte a pessoa já é convidada para uma festa ou um churrasco? Sabe aquela simpatia estampada no rosto, a abertura para se fazer piadas e gargalhar das coisas mais simples da vida? Pois é, sentia muita falta disso tudo. Mas, antes de reclamar e fazer beicinho, decidi tentar entender porque na Holanda as coisas eram diferentes. Resolvi prestar um pouco mais atenção nas amizades holandesas e pensar um pouco mais nas relações brasileiras.
As diferenças são evidentes. Muitas das minhas amizades vieram através do trabalho e no Brasil, estava acostumada a ligar pros meus amigos e marcar um chopp no mesmo dia. Aqui a agenda fala mais alto e tudo tem que ser programado. Quando o ambiente é favorável, falar sobre a vida pessoal no trabalho, dividir procupações é normal entre colegas brasileiros. Aqui a vida pessoal é guardada a sete chaves no trabalho e os amigos geralmente vêm através de uma atividade em comum como música, esporte ou qualquer outro hobby. As amizades brasileiras me parecem mais fáceis de se conquistar, mas ao mesmo tempo mais fugazes. Os brasileiros em geral têm menos reservas em relação à vida privada e, ao encontrarem alguém disposto a ouví-los, são capazes de fazer as páginas das suas vidas mais emocionantes que qualquer novela da Globo. Um sorriso largo e duas palavras em concordância com a sua opinião são capazes de criar uma intimidade mais instântanea do que qualquer macarrão de 3 minutos. No entanto, são raros aqueles que estão presentes nas horas difíceis ou quando existe algo a ser feito que não seja participar de uma festa.
Refletindo sobre o assunto, vi que se a espontaneidade, a exposição dos sentimentos e as gargalhadas são menos freqüentes entre os holandeses, isso não quer dizer que os laços de amizade sejam menos sólidos. Pude perceber maiores seletividade e profundidade nas relações. Também uma maior disponibilidade em ajudar nos momentos em que se precisa de alguém. Eles estão sempre presentes numa mudança, na hora de pintar a casa nova ou em todas essas situações em que normalmente no Brasil podemos pagar alguém para fazer por nós. Acredito que aqui a palavra amigo é pronunciada com mais cautela, mas não com menos sentimento. A verdade é que, através de caminhos diferentes, brasileiros e holandeses chegam a uma mesma conclusão: amigos verdadeiros são poucos e isso independe do lugar onde você esteja.
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