João Bosco: um show de Brasil no Bimhuis
Texto: Clarissa Mattos
Fotos:
Ron Beenen
João Bosco se apresenta no Bimhuis e traz o melhor da MPB para Amsterdã.
Ingressos esgotados, uma sala lotada o esperava. E não podia começar melhor; num palco em penumbra, sentado em um banquinho, João Bosco encheu a pequena e intimista sala com os versos de Nação. Depois da segunda canção, ele abre espaço para a banda: o primoroso Nosso Trio, formado por Ney Conceição no baixo, Nelson Faria na guitarra e Kiko Freitas na bateria e a brilhante percussão de Armando Marçal. Uma coisa era certa, uma noite de excelência em música brasileira estava garantida.
Ouvir o violão de João Bosco é reafirmar o melhor da música brasileira e, na companhia desses músicos primorosos, seus improváveis acordes e mágicas melodias ganham ainda mais cor. Um verdadeiro mix de MPB, jazz e bossa nova que provoca a platéia com um arco-íris de ritmos, sons e sensações. Esses músicos já o acompanham por um bom tempo e a intimidade e o prazer de tocarem juntos era evidente.
Com um repertório bem equilibrado, João Bosco apresentou os sambas da década de 70, as românticas composições dos anos 80 e outros sucessos da bossa nova e MPB. Lígia, de Tom Jobim ganhou uma suave e tocante roupagem de jazz e Águas de Março, também do maestro, tantas vezes tocada, guardou ainda um toque inovador. Também não faltou um bem temperado Vatapá de Dorival Caymmi, que ainda trouxe mais sabor à apresentação.
Josee Koning e Africanidade
Pode-se dizer que a base do show foi o DVD Obrigado Gente, lançado em 2006 em comemoração aos 60 anos do compositor e 30 anos de carreira. A canção Memória da Pele foi cantada em dueto com a holandesa Josee Koning, que, na verdade, repetiu a dupla já presente no seu álbum Bem Brasileiro. O tom escolhido favorecia a João, o que dificultou a apresentação da cantora, mas nada que prejudicasse a beleza da composição e a performance dos dois artistas.
O romantismo permanece na sala e se intensifica com Desenho de Giz, fruto da parceria de João Bosco e Abel Silva. Mas a diversidade e inventividade tão inerentes ao trabalho de João veem com força total em Pret-a-porter de Tafetá e Senhoras do Amazonas, que nos pegam pelo pé, nos conectam e nos jogam num universo afro-latino-brasileiro da instrumental Gagabirô: Canto de Wemba, composta após uma viagem à Cuba. Cantos religiosos, batuques, tambores. Abre-se o coração da América Latina na sua porção mais africana.
O bis foi generoso: três músicas e dentre elas, a belíssima e sempre pedida Papel Machê, escrita em parceria com Capinam.
Brasilidade assumida
João Bosco exala uma brasilidade tão assumida, que nos traz de volta ao ninho. Letras melodias e arranjos que evocam um Brasil forte e com um brio contagiante. A sua habilidade singular de fazer scats – canto, vocalizações sem letra– nos faz viajar num mapa musical sem fronteiras, mas que sempre nos traz de volta às origens. Posso dizer que me senti mais brasileira ao sair do Bimhuis e o melhor, orgulhosa disso.
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