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Emigrantes assumem seu próprio caminho

Irene Zwetsch

 

A emigração brasileira cresceu significativamente nos últimos 20 anos e tem criado, nos vários países onde se estabeleceu, estruturas próprias para enfrentar os desafios que a integração numa nova realidade apresentam. A aprendizagem da língua local, a procura de emprego, a adaptação a uma nova cultura, o reconhecimento do diploma obtido no Brasil, a convivência com um parceiro ou parceira estrangeiros e a consequente forma de educar os filhos algumas das dificuldades com as quais os emigrantes se confrontam.

Uma das maneiras encontradas para encarar a nova forma de vida e vencer as barreiras foi a organização em grupos e associações de toda natureza: culturais, religiosas, de informação, de auto-ajuda, de educação, além de empresas e meios de comunicação. Presentes em todos os países onde os emigrantes brasileiros se instalaram, são esses grupos e associações que convivem e auxiliam, na maioria das vezes de forma voluntária, no enfrentamento das questões diárias que afetam a vida de quem resolveu sair do Brasil para tentar a sorte em outro país. É uma forma dos emigrantes assumirem seu próprio destino e manterem vínculos com sua Pátria, mantendo escolas para o ensino de português, palestras informativas sobre direitos e deveres, atividades que divulgam nossa cultura e mostram aos moradores locais um pouco da diversidade que é o Brasil.

Essa realidade emigratória não passou desapercebida pelo governo brasileiro que está dando passos em direção aos brasileiros emigrados e criando formas de apoiá-los. O lançamento em 2007 da brochura “Brasileiras e Brasileiros no Exterior”, editada pelo Ministério do Trabalho com apoio institucional do Ministério das Relações Exteriores e outros ministérios, além da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do Instituto Migrações e Direitos Humanos entre outros, foi um marco, pois traz informações úteis para quem quer viver (ou já vive) fora do Brasil. Essa brochura passou a ser distribuída pelos Consulados no mundo inteiro e também em alguns aeroportos brasileiros.

Outro marco importante foi a I Conferência Brasileiros no Mundo, realizada pelo Ministério das Relações Exteriores (MRE) em julho do ano passado no Rio de Janeiro. Nesse evento além de debater questões ligadas à emigração foi decidido formar um Conselho Provisório de Representantes das Comunidades Brasileiras no Exterior para ajudar na organização da II  Conferência, que será no Rio de Janeiro, no final de agosto deste ano. Esse Conselho Provisório não tem mandato ou mesmo legitimidade para tomar qualquer decisão em relação à política do Itamaraty junto aos brasileiros emigrados, mas vai ajudar a definir os temas que devem ser debatidos e a forma de escolha de representantes para a formação de um Conselho Permanente dos emigrantes.

Os temas abordados durante a I Conferência foram reunidos na versão final das Atas Regionais (por continente) e da Ata Consolidada da Conferência, elaborada pela Subsecretaria-Geral das Comunidades Brasileiras no Exterior (SGEB), responsável pela organização do evento (resumo do conteúdo das quatro atas regionais), e estão disponíveis para consulta no Portal Consular do MRE: www.abe.mre.gov.br.  Neste portal também se encontram as propostas enviadas pelas diversas organizações e entidades brasileiras no exterior e que expressam a realidade dos brasileiros nos diversos países.

Existe também um registro audiovisual integral de todos os momentos do evento no site da Fundação Alexandre Gusmão (FUNAG) - www.funag.gov.brNo mesmo Portal há uma versão eletrônica do documento "Diretório das Comunidades Brasileiras no Exterior", que reúne os dados atualmente disponíveis de associações e organizações de brasileiros no exterior, imprensa e mídia voltadas para a diáspora brasileira e referências bibliográficas e audiovisuais  sobre brasileiros no mundo.

Representação dos brasileiros
O Conselho Brasileiro na Suíça (www.conselho-brasileiro.ch) também está representado nesse Conselho Provisório de organização da II Conferência, por meio da assistente social Regina Jomini. Aliás, dois dos três representantes da Europa nesse Conselho Provisório são da Suíça, o que não espelha  de forma alguma a realidade da emigração brasileira no continente. Inglaterra, Espanha e Portugal, que reúnem um número muito maior de brasileiros, também deveriam estar representados. O Conselho Brasileiro na Suíça tentou junto ao MRE abrir mão de sua vaga em favor de alguém desses países, mas não foi possível. Por isso está recolhendo sugestões de várias fontes na Europa para levar ao evento.

Nas propostas enviadas para a I Conferência, o Conselho Brasileiro na Suíça abordou as áreas da educação, trabalho e previdência, registro de nascimento e passaporte para filhos de brasileiros, homologação de divórcio, simplificação e reconhecimento dos registros emitidos nos Consulados, divulgação da cultura brasileira no exterior, política em relação aos brasileiros emigrados e representação em Brasília, reivindicações da população emigrante em relação aos serviços consulares e diplomáticos. As propostas detalhadas podem ser lidas na página do Conselho, na parte sobre a I Conferência (Atividades).

Em vários órgãos da imprensa tem sido divulgado que o tema principal da II Conferência Brasileiros no Mundo será o de se lançar as fundações e estruturas de um organismo emigrante autônomo. A informação não foi confirmada pelo Chefe da Divisão das Comunidades Brasileiras no Exterior, Aloysio Gomide Filho. Ele afirmou que “qualquer informação que diga respeito à Subsecretaria-Geral das Comunidades Brasileiras no Exterior e que não tenha sido emitida pela SGEB/MRE não conta com nosso endosso. Ou seja, a matéria é da inteira responsabilidade de quem a redigiu.”

Órgão Institucional e Autônomo

Há quem defenda a criação de um “órgão emigrante autônomo, independente e laico” como forma dos brasileiros emigrados assumirem o seu destino. Um dos argumentos é que as iniciativas brasileiras espalhadas pelo mundo são “dispersas e sem força ou poder por não serem federalizadas” (unidas numa federação). Nesse ponto talvez haja algumas exceções. Na Suíça, por exemplo, dos vários grupos espalhados pelos cantões (estados) do país formou-se um Conselho, que já organizou diversas atividades informativas, como os Encontros Brasileiros na Suíça (www.encontro-brasil.ch) e tem atuado para o conjunto da comunidade brasileira na Suíça a partir da experiência recolhida na base, junto aos próprios emigrantes.

Também a formação da Rede Brasileira na Europa (www.rede-brasileira.eu ), que aconteceu no II Encontro de Brasileiras e Brasileiros no Exterior, realizado em final de 2007 em Bruxelas, espelha um movimento no sentido de entrelaçar as iniciativas locais numa rede que pretende ser mundial.

Tanto o Conselho como a Rede surgiram da base, não são organismos institucionais, não recebem financiamento do Governo do Brasil e existem por meio do trabalho voluntário e de projetos de apoio às iniciativas de migrantes. Nesse sentido já são “órgãos emigrantes autônomos e independentes”.

Um segundo argumento é a necessidade de “ter poder” para dar mais direitos aos brasileiros no exterior. Já existe dentro do MRE a Subsecretaria-Geral das Comunidades Brasileiras no Exterior, que tem como função “cuidar dos temas relativos aos brasileiros no exterior e aos estrangeiros que desejam ingressar no Brasil, incluindo-se a cooperação judiciária internacional” (reitrado da página do Ministério). Não é necessário criar outro órgão com uma estrutura mínima para funcionar, que representaria mais custos para os contribuintes. Precisa-se dar mais poder à estrutura já existente e melhorar seu funcionamento.

Certamente é preciso equipar melhor os consulados,  capacitar seus funcionários e principalmente fomentar a interação dos consulados e embaixadas com as organizações, associações e grupos brasileiros de todos os gêneros existentes nos diversos países. São essas entidades que conhecem a realidade local, falam a língua local e fomentam a integração dos brasileiros na sociedade em que se encontram.

Vale lembrar que há diferenças nos diversos países e que os problemas enfrentados pelos brasileiros em sua vida cotidiana na maioria das vezes dizem respeito às leis e regras do país de acolhida e não dependem de decisões tomadas em Brasília ou que dizem respeito ao governo brasileiro. Nesse sentido, a emancipação dos emigrantes brasileiros passa pela participação ativa nas associações e grupos existentes e na formação de outras, pelo intercâmbio e interação desses grupos e pelo reconhecimento desse “movimento de base” pelas autoridades brasileiras.

Movimentos como o dos Brasileirinhos Apátridas só foram bem sucedidos porque houve trabalho de base, desenvolvido pelos grupos, associações e pessoas privadas nos diversos países. Foi no contato direto, na divulgação pelos meios de comunicação editados pelos emigrantes e no esforço coletivo que o movimento ganhou corpo e força. É claro que é necessário ter contatos em Brasília, conhecer os “caminhos do poder” para fazer esse trabalho de base atingir o resultado pretendido. Mesmo assim, a partir da experiência colhida junto aos emigrantes, vê-se que não há necessidade de criar uma estrutura paralela à estrutura consular, um novo Estado, para desempenhar as funções que o próprio Consulado deve desempanhar ou para encaminhar leis que os deputados e senadores brasileiros estão sendo pagos para propor e votar.

Enquanto se acreditar que apenas a criação de um órgão especial para tratar dos problemas dos emigrantes for a solução, continuaremos seguindo no pensamento paternalista de que tudo tem que ser feito pelos outros. Enquanto o que nos mover for a sede de “ter poder”, vamos continuar multiplicando fora do Brasil um conceito que por muito tempo criticamos dentro do nosso país.

As estruturas para atender e apoiar os emigrantes já existem, o que é preciso é adaptá-las, ampliá-las e aprender a cobrar que realizem seu trabalho de forma profissional. Enquanto cada um não fizer a sua parte, nada vai mudar. Sobretudo em tempos de crise como os que enfrentamos agora, a palavra de ordem deve ser conter gastos e otimizar o trabalho existente.

Por Irene Zwetsch, jornalista e intérprete intercultural, editora do informativo CIGA-Informando (www.cigabrasil.ch/informando) e membro do Conselho Brasileiro na Suíça

 

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