Cartas do Brasil
De Jota Alves
Fiscalização
“Sem educação na escola, em casa, na sociedade, o sujeito chega às estradas um desajustado no volante. Para essa sanha assassina e tanta morte nas nossas estradas só fiscalização, muita e permanente fiscalização”. Membro da PRF de Minas Gerais.
“A ANAC tem que fiscalizar a aviação de jatinhos, de aviões particulares. Vamos adotar medidas”. Ministro da Justiça, logo após mais um acidente aéreo em São Paulo.
Recentemente, sugeri que o melhor presente que o presidente Lula pode dar ao país é parar com as suas muitas viagens ao exterior. Só sair do Brasil em extrema necessidade de sua presença física, como na Bolívia, e criar um gabinete para um SAR (Soluções Administrativas Rápidas) com ênfase na fiscalização. Passar um pente-fino em TODAS AS AGENCIAS REGULADORAS, onde estão os maiores gargalos do governo federal.
Mais uma vez, brasileiros no exterior sem passagens de volta. Setenta mil passageiros prejudicados, principalmente, aqueles que compraram passagens para as férias e as festas de fim de ano. M.S.P, aeromoça da BRA: “nos cinco aviões da BRA não servíamos nada para comer, em vôos de até três horas. E às vezes nem água. Tínhamos que fazer, de tudo um pouco. Problemas com a despressurização e outros. Perdi o emprego, quero meu salário, mas foi melhor parar agora antes de grandes tragédias, com milhares de mortos”.
Reembolso do pagamento de passagens? O tempo dado pela ANAC (o caridoso big brother das empresas aéreas) é de 30 dias. Escritórios da BRA fechados, telefones não respondem, a burocracia proposital, como e de quem receber o reembolso em trinta dias?
Tivéssemos tradição, educação e respeito por fiscalização permanente e a companhia aérea BRA não teria sido um desastre para seus mais de mil funcionários, no olho da rua. Como acreditamos que Deus é brasileiro nos salvamos de tragédias com centenas de mortos.
Com a palavra o piloto Kleber Mansur, presidente da Associação Brasileira de Pilotos de Helicópteros: “é complicado voar em São Paulo. A Infraero precisa investir no Campo de Marte. Faz quatro anos que prometeram mudar o heliponto de lugar e construir um tanque de combustível próximo à pista. Falta azeite no sistema. Tudo é muito lento e acidente não espera burocracia, ele ta ali para acontecer. Temos a segunda maior frota urbana de helicópteros do mundo. Oitenta e cinco mil pousos e decolagens por ano”.
Se as grandes empresas não são vistoriadas e fiscalizadas com rigor, imaginemos as pequenas e médias, fora dos grandes centros, onde a promiscuidade do compadrio e a corrupção são endêmicas! Ninguém fiscaliza ninguém. Viajar de avião é uma loteria.
E o leite com soda cáustica e água oxigenada...? E o pão com brometo...? E o café com milho moído? E a goiabada de chuchu, de mamão? E a carne? E os remédios falsificados, adulterados? E o peso nos embalados e enlatados? E os laticínios? E a data de validade nas etiquetas? E a água com que se lava as hortaliças? E a água que bebemos? E a gasolina? E as tarifas telefônicas, com as teles raspando o tacho da economia popular com truques e roubalheiras? E o aumento das tarifas de água, luz, gás, transporte coletivo, seguro saúde?
Nesses cinco anos o presidente deve ter passado mais tempo ao lado de seu ministro do exterior do que com a sua esposa e primeira dama. Lula se elegeu como o presidente dos nossos sonhos e esperanças. Agora ele precisa ser o presidente das soluções dos problemas cotidianos que afligem, estressam e infernizam a vida da grande maioria do povo brasileiro.
Lula precisa ficar e estar em Brasília e comandar a sua máquina administrativa. O país precisa de um GERENTE, um ADMINISTRADOR FEDERAL. Nas muitas instancias de poder só anda o que dá resultados imediatos, pessoais, eleitorais. Primeiro, eu e os meus.
È preciso desatar os muitos nós cegos na burocracia federal e motivar do segundo escalão administrativo pra baixo. Ministro no Brasil não suja os pés. O político está ministro por indicação e pressão de grupos. Se sair de Brasília para cobrar e acompanhar obras, quando regressar pode não ser mais ministro.
No poder, todo mundo quer dar uma de estadista. Lula sempre esteve cercado de teóricos, ideólogos, pensadores, filósofos, contestadores. Precisa e com urgência convocar e se cercar de fazedores, implementadores, práticos e fiscalizadores.
Com os “Fiscais do Sarney” pela primeira vez o país valorizou e prestigiou a idéia e a profissão. Quando em vários artigos insisti para a prefeitura de Cuiabá prestigiar e honrar o fiscal Luis Carlos Farias Martins (e seus dependentes), assassinado em pleno cumprimento de seu dever, ao autuar um atiçador de fogo e de queimada, tinha e tenho como objetivo chamar a atenção para essa fraqueza nacional: não punir, para não ser punido, não fiscalizar para não ser fiscalizado. Não respeitar fiscalização é uma praga brasileira. Cupim cultural.
O que é o Promotor Público? Um fiscal da lei. O que é o Juiz? Um fiscal dos processos, um interprete e implementador da lei. O que é o Procurador? Um fiscal do Estado. O que é o Advogado? Um fiscal que administra as partes, que defende ou acusa? O que é o Policial? Um fiscal que deve proteger e servir a população. O que são as Forças Armadas: fiscal-defensoras da nação. O Pastor? Fiscal da sua igreja. O Padre? Fiscal do Papa. Os ícones, os perfis e as configurações existem. Mas, mais e mais pessoas morrem nos hospitais públicos.
Mais pessoas morre nas estradas brasileiras. Mais brasileiros estão caindo por balas perdidas. Mais guerras nas cidades. Mais assassinatos urbanos e rurais. Mais acidentes aéreos. Mais falsificações. Mais e mais lucros estratosféricos de instituições financeiras (no sistema, para alguém ganhar, alguém tem que perder). Mais corrupção.
Isso e muito mais que atravanca o presente e nos deixa sem perspectivas positivas para o futuro acontece porque o país não quer se autofiscalizar.
Ou promovemos, com urgência, a cultura, a educação e a administração da fiscalização necessária e democrática, em todos os níveis, ou os números e estatísticas de crescimento, do PIB, conquistas da Petrobrás, do etanol made in Brazil, mais e mais Bolsa Família e as bênçãos do capital financeiro internacional vão continuar nos levando à praia. Sofreremos e descansaremos, como sempre, em berço esplêndido.
08/11//2007
Comente
aqui: