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Johannes Goes, holandês, morou 15 anos no Brasil (Rio, Belo Horizonte, Salvador e Fortaleza).
Ensinava Inglês. Escreve por prazer, também autor e produtor de um Curso de Inglês de Conversação Prático. Casado com uma brasileira, 3 filhos e uma neta , mora no Algarve, Portugal. |
O Tonico
John Goes
Sou o pai do Tonico. O meu Tonico está me dando problemas.
Vive batendo na irmãzinha, coitada. Eu não posso com violência, muito menos na minha casa. Aqui no lar quero mais é paz e amor.
Foi o que eu disse à minha esposa quando ela veio dizer que o Tonico tinha a quem puxar e que este ‘quem’ era o meu irmão Umberto.
Porra, o meu irmão Umberto não, homem dos mais pacíficos que conheço, desde que não se metam com ele. Meteu , apanhou, como bem sabe a linguaruda da mulher dele. Umberto é como eu, desde que ninguém se mete, tudo bem, somos da paz. Foi o que eu disse à minha mulher quando tive que tascar um safanão nela por causa desta implicância com o meu irmão.
Aliás tive que lembrar a ela que o tal tio vigarista dela, que morreu crivado de balas no Acre, não era nenhuma flor que se cheira. Expliquei que se não fôssemos dar umas boas porradas no Tonico de vez em quando era bem capaz dele acabar do mesmo jeito.
Mulher teimosa que nem uma égua disse que não era assim que se criava uma criança.
- Então não foi assim que o meu pai me criou? disse eu,
- eu por acaso sou capaz de levantar a mão para quem quer que seja? Oh, mulher ......
Me deu uma vontade de dar lhe uma bofetada, mas me controlei e só dei um empurrão.
- Vamos conversar com calma e analisar o problema. Eu por mim acho que o garoto tem autismo e precisa de ajuda profissional e uma boa surra de vez em quando. O que você diz, mulher?
- Eu digo que ele puxou o seu irmão Umberto e que não vai ter jeito se for criado na base de pancadaria.
Já viu como a cabra é teimosa? Só porque nunca apanha como deve ser, fica abusando, já viu? Aí o pau teve que comer. Respeito é tudo. Logo quando estava dando uma lição de moral nela, me aparece a minha filhotinha , chorando também.
Parei imediatamente e perguntei:
- O que foi filhinha?
- O Tonico roubou o meu saco de pipoca.
- Não é possível. Esse menino vai ver uma coisa. Tolero tudo menos ladrão e vigarista. Você quer um pirulito? Tome. Me chame o seu irmão que quero ter uma conversa com ele. Já que estou com a mão na massa, mande ele vir falar comigo.
Igual como o meu pai fazia antigamente, tirei o cinto da minha calça e estreei umas chicotadas numa cadeira. O barulho soava tal e qual. Quem veio era novamente a minha filhinha, agora aos altos berros:
-Paiê, o Tonico disse que não vem, roubou agora o meu pirulito e por cima ainda pisou no meu pé.
Fiquei doido. Tolero tudo menos ladrão, vigarista, menino desobediente e moleque que pisa no pé da minha filha.
- Não chore filha. Vou já tratar disso. Você quer um picolé, quer? Então tome.
Gritei pela casa: -Tonico vem cá!! Tonicoooooooooooooo!
Lá veio o garoto todo medroso e querendo chorar antes da hora. Me doeu a alma, o rapaz parecia um medroso, nada de homem enfrentando o devido castigo.
- O que foi isso com a sua irmã?
- Foi ela que começou.
- Começou o quê?
- De roubar as coisas.
- Que coisas?
- O contole remoto da televisão.
- É o contrrrole. Para que ela quis o contrrole?
- Ela queria ver desenho e eu elefantes.
- Por que não deixava ela ver desenhos? Porque você tem que ser sempre tão egoísta e quer que só a sua vontade seja feita?
- Por que eu queria ver os elefantes.
- Por quê?
- Porque os elefantes estavam namorando duma maneira esquisita.
- Esquisita, como assim?
- Um elefante subia por cima do outro.
- Quer dizer ‘outra’.
- Não sei se era outra, talvez era o irmão ou um amigo dele.
- Nem pense numa coisa dessa, meu filho! Isto é contra a natureza. Quando são elefantes quem sobe é o macho e quem fica por baixo é a fêmea.
- Ah, é?
- Ah, é, o quê? Não estava vendo na televisão?
- Como é que vou aprender essas coisas se sempre tenho que ver desenhos?
- Chame aí a sua irmãzinha.
- O que foi paizinho?
- Olhe quando o seu irmão quer ver elefantes, deixa ele ver e você vem para cá e vai ganhar um picolé, tá bom?
Veio aí a minha mulher:
- É assim que cria, é? Mimando a menina? Fazendo vontade do menino?
- É, fiquei preocupado. Tem 5 anos e ainda não sabe das coisas. Se não tomar medidas agora, é capaz de ficar que nem o seu tio Armando, aquele maricas.
©John Goes, 2006
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