Primeiros contatos, integração e preconceito
Luana Ferreira
Quando eu cheguei, tudo era lindo.
Lembro das primeiras vezes que saí por aqui quando dois colegas do meu namorado me perguntaram por que eu tinha trocado o Brasil pela Holanda, incrédulos. E eu, inocente, não entendia como eles tão jovens já estavam de saco cheio de viver num país tão legal, com tantas vacas e flores.
Pois bem, agora eu entendo. E me pergunto qual seria a opinião desse casal de holandeses se eles tivessem aqui, como imigrantes, como nós. Sentindo na pele o quão difícil é se adaptar a um país com clima, cultura e língua tão diferentes. E penso que se já é difícil para nós, brasileiros, ocidentais, com raízes européias como deve ser para um árabe, com língua e costumes ainda mais diferentes, conseguir achar um lugar ao sol. Digo isso porque no meu curso de integração, a maioria esmagadora é árabe. E foi com eles, mais do que com os holandeses, que a expressão “choque cultural” começou a fazer mais sentido pra mim.
Se volta e meia eu jogo a minha toalha achando que nunca vou achar um trabalho interessante, que as chances são infinitamente menores para imigrantes, que Holandês bem falado é impossível no meu mundo, olho para os lados e me pergunto se no fundo estamos todos, de fato, no mesmo barco.
Mil vezes pior do que conviver com o estigma do samba e futebol* deve ser ter a imagem associada ao terrorismo, a uma sociedade fundamentalista ou à guerra permanente.
Quando eu descobri que tinha dois colegas afegãos, primeiro eu achei tudo neles estranho. Depois já queria muito puxar papo, saber mais sobre eles mas a única lembrança que a minha mente captava sobre Afeganistão era Osama Bin Laden.
Um certo dia, novo colega marroquino adentra a sala e eu estranhei seu casaco colorido e o brinco na orelha direita. Por que ele não usava um turbante e uma longa barba?
O mesmo aconteceu quando um novo colega iraquiano se apresentou, falando que gostaria muito de conhecer o Brasil. Eu perguntei pra qual cidade ele queria ir e ele nem pestanejou: Buenos Aires e Rio de Janeiro! Dadas as devidas explicações, por que um iraquiano iria querer conhecer o Rio?
Aí eu percebi que eu já tinha uma imagem estereotipada do “mundo árabe” na minha cabeça. E eu, que sempre me considerei mente aberta, estava rotulando uma realidade que eu não tinha idéia do que se tratava. Estava, sem querer, sendo preconceituosa e agindo da mesma forma que eu não gostava quando estrangeiros só viam samba e futebol no Brasil. Não por maldade mas por pura ignorância.
Percebi também, que o estranhamento inicial dava, invariavelmente, lugar a uma curiosidade enorme, que me fez passar por cima do holandês precário pra conhecer mais sobre a vida e a cultura dos meus novos colegas. Porque não conhecendo nada sobre um país, qualquer símbolo passar a uma representação muito mais viva do que bandeiras e posição geográfica. Vacas, flores, turbantes, burkas, samba e futebol são os primeiros inputs que alguém recebe do que totalmente ignora.
Começando a ver meninas turcas sem lenço, iraquianos que não gostam do Sadam Hussein, marroquinos usando brinco e, principalmente, conversando mais com meus novos colegas, essas imagens pré-concebidas, aos poucos, foram desaparecendo. Algumas até foram reforçadas, mas isso já é assunto pra outra conversa.
Ficou muito mais fácil entender porque todo mundo pede para eu sambar ou começa a falar de jogadores que nem conheço quando falo que sou brasileira. E isso agora, longe de me irritar, me faz contar com mais empolgação quanta coisa boa nossa terrinha tem pra oferecer!
E vocês? Como foram os seus primeiros choques??? Curiosa ; )
(*)Nada contra samba e futebol, pelo contrário. Super-ufanista, achava uma pena um país tão enorme e diverso ser reduzido aos dois.
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