TOBY
Sérgio
Godoy
Os
holandeses são apaixonados por animais e plantas. É raro
entrar em uma casa na Holanda e não ver diversos potes
de plantas decorando a sala ou um gato dormindo no sofá.
Toby
surgiu em nossas vidas por descontrole do destino, uma
amiga iria voltar definitivamente para sua casa, em Sidney,
e pediu para que nós procurássemos uma nova
moradia para seu gato. De início pensamos em dizer
não, mas sensibilizados com o animal, o recolhemos
temporariamente. Toby ficou conosco por um ano. Tivemos que
nos adaptar com sua presença e demandas. Sempre que íamos
viajar havia o incômodo de pedir para algum amigo alimentá-lo
duas vezes por dia. A ida ao supermercado também fazia
parte das compras necessárias para o animal e sempre
acabávamos esquecendo alguma coisa. Entre o prazer
de tê-lo dentro de casa e a obrigação
de mantê-lo até que surgisse uma nova alternativa,
havia também certa irritação. Algumas
vezes nos divertíamos com sua maneira peculiar de
comportar-se, pois era uma gato temperamental e carente de
atenção. Durante a madrugada acordavámos
com Toby miando em tons agudos; penetrante som que não
só incomodava a nós, mas também aos
vizinhos.
Com
o passar do tempo percebi que já não
alimentava-se como antes e tentei em vão trocar por
outras marcas de alimento, alguns com peixe, outros com carne
e até mesmo vegetais, mas o bichinho não queria
saber de nada. Foi quando o levei ao veterinário e
me assustei: Toby já era um gato muito idoso e estava
totalmente senil. Ainda assim resolvemos dar-lhe uma nova
chance e comprei um massageador eletrônico: um equipamento
que, ao ser ligado à tomada durante a noite, exala
um odor simulatório ao toque humano, promovendo-lhe
conforto. Infelizmente não adiantou nada e as noites
seguintes também não tornaram menos silenciosas.
Telefonei e marquei uma consulta definitiva com o veterinário,
que me informara sobre o melhor método de colocá-lo
dentro do “eterno sono”, uma vez que sofria bastante
e a tendência era sofrer muito mais. A primeira opção
era de preparar um próprio velório e Toby seria
enterrado em um cemitério para animais. A segunda
opção era enterrá-lo em nosso jardim,
mas como moramos em um apartamento, essa opção
foi imediatamente descartada. A terceira e última
opção era cremá-lo.
Com
a data marcada para sua despedida, comecei a sentir-me
incomodado e triste. Durante toda a manhã o observei
brincar no chão com bolas de papel, vagrosamente caminhar
em direção à comida e nada comer. Fiquei
pensando na fragilidade da vida; em três horas ele
já não mais existiria. O coloquei em meu colo
e fiz-lhe carinhos, deixei com que pulasse no sofá sem
preocupar-me com pêlos soltos.
Ao
chegar à recepção do consultório
entreguei Toby para uma das enfermeiras e comecei a preencher
o formulário: meu nome, endereço, nome do animal
e minha assinatura. Optei para que ele fosse cremado e fiz
o pagamento. Despedi-me de Toby que miava sem parar e antes
de sair, a enfermeira segurou meu braço e delicadamente
disse que em caso de necessidade ela poderia indicar-me a
um grupo de apoio. “Grupo de apoio?” Indaguei.
Aparentemente existe na Holanda grupos de pessoas que se
dedicam ao apoio emocional àqueles que perdem um animal
de estimação. Agradeci e saí do consultório
veterinário rapidinho. Fui para casa cabisbaixo e
comecei a recolher os pertences do gato. Coloquei tudo dentro
de um saco e levei para fora.
O
dia passou com estranhas sensações e depois de um mês ainda sentíamos
sua falta. Os amigos perguntavam pelo gato e apesar de todo
o vestígio de sua presença ter desaparecido
da casa, uma volta ou outra ainda encontrávamos alguns
pêlos escondidos em algum canto. E para eterna lembrança,
fizemos um quebra-cabeça com uma das fotos de Toby
e o enviamos para nossa amiga em Sidney.
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