BIFURCAÇÕES

Sérgio Godoy

Fazia muito frio naquela tarde de sexta-feira do mês de janeiro em Amsterdã, mas sentou-se no banco da praça. O sapato coberto por uma fina camada de neve, as mãos no bolso porque na pressa de sair de casa esquecera as luvas. Era necessário que saísse e de preferência, nunca mais voltasse. Por um momento odiou tudo ao alcance de seus olhos; as árvores, a arquitetura da cidade que aprendeu tanto a gostar. Fácil seria deixar tudo para trás, partir sem justificativas, livre de qualquer obrigação.

Sorriu desiludido, abaixou a cabeça e caminhou em direção ao bar mais próximo. Ilusão, pensou. Partir… mas para aonde?

O olhar distanciando-se do barulho, das vozes em diálogos desconhecidos. A permanência que por fim esgotara a maior alegria da vida: seu coração apaixonado. Não pertencer à mesma raça. Cão perdido e humilhado. A mulher com pés em sólido chão. Ele, o estrangeiro com a mão nos bolsos tentando definir seus passos. No espelho do bar, no formato escuro de sombras, um sol sul-americano brilhava; talvez fosse o melhor retorno, a mais forte coragem. Intrépido, voltou ao apartamento, abriu a porta como quem conquista território, passou pela figura que, sentada na poltrona, fumava um cigarro na inércia dos dedos, arrumou a pequena mala com precisão; camisa sobre camisa na própria arquitetura de seu novo intento. No bolso, o passaporte ocupando importante espaço. Agora, tudo torna-se insignificante. Talvez em outro país, talvez uma outra mulher.

Comente aqui: